terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A VACA MANSINHA


                           



A      VACA     MANSINHA*

João Henriques da Silva
(In Memoriam 20/09/1901 – 16/04/2003)

 Era outro animal de maior estimação. Era como se fizesse parte da grei. Creio que foi adquirida do José Vieira, lá da zona do Brejo de Alagoa Nova, criada na corda desde novinha, aprendera a conviver com as pessoas. Gostava de ser acariciada em qualquer parte onde estivesse.
          Era a mansidão em pessoa. Era um mimo de animal bem conformado. Baixinha, sempre gorducha, boa leiteira e sem qualquer espécie de manha. Não havia preço para ela.
            - Teria que morrer no pasto. E foi assim. Meu pai dizia - Ninguém vai tocar nela. Ajudou a criar os meus filhos e é um animal de estimação.
 Havia quase uma devoção à vaca Mansinha. Ninguém se atrevia sequer a gritar com ela. Teria até vergonha de tratá-la com grosseria. E era engraçado, aprendera os hábitos do seu ex-dono. Educado, tranqüilo e gorducho.
          Um lembrava sempre o outro. Também não tinha pressa. Nada de correrias e chifradas. E era uma mãe exemplar. Tinha ciúme de suas crias e estava sempre vigilante. Parecia até que era muito mais mãe do que muita gente que anda por aí.
          Não escondia leite. Tinha-se que tirá-lo e deixar a parte do bezerro. Minha mãe sempre perguntava por Mansinha. Como é já teve cria? Cuidado com Mansinha. Os partos sempre foram normais. As crias eram sempre machos. Parecia até que as outras vacas a respeitavam.
          Era um exemplo de educação e de paciência. Admirável! Quando José Vieira chegava, perguntava logo pela vaca Mansinha. Tinha saudades dela. Tinha-se às vezes a impressão que nos visitava mais para vê-la e matar saudades, do que propriamente por outra coisa. Ficou muito triste quando soube que havia morrido. Ficou pensativo como se houvesse sido uma pessoa da família ou amigo de todas às horas.
          Mamãe chorou. A meninada também. Meu pai, ninguém sabe. Talvez às escondidas. Nunca deu parte de fraco...

*O conto pertence ao livro “Vidas Nordestinas”, no prelo.

Nota: recordações de infância do meu pai, na fazenda Arara, Município de Esperança Paraíba, onde nascera e se criara.


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