domingo, 31 de julho de 2022

 

Conversa Fiada

 

Engenho Burra Leiteira, ficava no Município de Carambola. Lugar onde o cão perdeu as esporas. Da sede municipal para lá, fica umas três léguas de beiço, que se fosse medir daria bem umas quatros. No entanto, a fazenda possuía muita terra boa de cana de açúcar que produzia boas rapaduras com um doce insuperável; talvez pelas terras de massapê. Dava emprego a muita gente das redondezas. Todo mundo já tinha sido morador do engenho. Era quase um oásis. O velho engenho funcionava, já havia vários anos, a força de éguas e bois mansos.  Passado de pai para filho, acho que vinha dos tempos dos Afonsinhos. O atual proprietário era o coronel Marsurpião Pinto Barbosa dos Anzóis Pereira, filho único. Cabra sem cabresto. Não valia o que o pinto come. Mas mesmo assim era respeitado por toda aquela região sem lei e sem ordem. Era o delegado, Juiz e promotor. Parteiro, médico, farmacêutico e dentista e nas horas precisas e urgentes, virava padre.

Casou-se com uma moça prendada lá da capital, quando fora estudar pra ser gente, porém seus miolos não ajudaram e voltou sem diploma, mas com uma certidão de casamento bem passado.

Dona Anfrosina era feia, mas tinha seus encantos secretos e filha de pais bem possuídos nos bens. Ele também não era lá uma flor para se admirar. Tinha uma cara mais parecida com jumento novo. O casamento foi um encontro do destino desalmado.

Afinal de contas quando o velho pai bateu a caçoleta, ficou senhor de engenho. Coronel. Título que naquela época passava de pai para filho, para os menos avisados.

Botou o negócio para funcionar às mil maravilhas, no entanto, sua querida e submissa esposa não botava menino pra fora. Passava o tempo e nada. Foram até aos médicos da capital tentar uma solução. O médico aconselhou dormir numa rede e botar fogo em baixo. Nada!

 A mulher dizia que o problema era com ele. Por sua vez dizia que ela tinha vergonha de se mexer. Fogo morto no casamento. Nem um bruguelo pelo menos.

O homem queria um herdeiro para eternizar seu poderio nas terras de meu Deus.

O cabra então começou a pular fora do ninho pensando que era ele que tinha o ovo goro e para provar e não servi de mangação para os amigos e parentes virou um bode danado. Não podia ver uma saia se mexer que caia em cima. Principalmente as filhas dos moradores. Dizia que mulher é como miunça, deu no couro... Não escapava nada. Era o rei dali.

Um dia, chega seu Zenobio com a família para trabalhar nas terras do seu coronel Pinto como era mais conhecido. Ele a esposa Bertina e a filha Rosa de Judá, criada com todo o mimo que um casal podia dar a uma filha. Quinze anos de beleza e de doçura.

Um belo dia Bertina chama Zé e lhe diz. - Buliro com Rosa!

- Quem foi o fio de uma égua que fez isso com Rosinha. Vou matar esse desgraçado. Vou sangra e tirar até a última gota de sangue desse bandido.

- Foi o coroné!

- Vou agora mesmo tomar satisfação com esse velhaco.

Partiu em procura da casa grande do engenho. Pediu para falar com o coronel.

- Entre e sente seu Zenobio, o homem vem já – Disse sua dona Anfrosina.

- Bom dia meu cidadão. Tudo em paz? O que é que manda? Estamos as ordens. Que uma aguinha fria com pedacinho de rapadura?

- Não senhor. Vim tratar de um assunto muito sério. Vim dar uma denúncia ao senhor.

- De jornal?

- Não senhor!

- Vim dizer que ofenderam minha filha.

- Comeu alguma comida estragada?

- Não senhor!

- Vim dizer que defloraram minha filha!

- Oxente. Mulher vem cá. O engenho agora vai melhorar, vai passar trem por aqui vão derrubar muita mata.

- Não senhor. Vim dizer que comeram minha filha.

- Vigi meu Deus, com farinha?

Seu Zenobio, levantou-se e saiu sem olhar para trás. Ganhou o oco do mundo com Bertina, Rosinha sua querida filhinha e mais um herdeiro do coronel dono do engenho Burra Leiteira.

Granja Lírio do Brejo, 20 de novembro de 2021 as 19.40 horas.

Grijalva Maracajá Henriques

(Lembranças do Sítio Cerquinha das laranjas em Penedo Alagoas e de seu Zé Vicente com suas histórias engraçadas)