O PAPEL DA MAÇONARIA NA CONTEMPORANEIDADE
Perguntaram-me
para que serve a Maçonaria num tempo em que o pensamento filosófico
contemporâneo apresenta uma visão de mundo em que nada é permanente.
Que a matéria se
apresente em permanente mutação, sempre fluindo, não há nada de novo e nem a
questionar. Olhando lá das estrelas tudo
na terra se move. Velhas formas de agregação vão sendo dissolvidas, enquanto
novas surgem.
Mas, antigamente,
havia a "certeza" de que algo era permanente, algo que existia independente
da contingência material. Neste algo estava o conceito da imortalidade da alma.
Sendo ele, um dos dois conceitos transcendentais presentes nos Landmarques que
delimitam a Maçonaria. O outro é a crença na existência de um princípio criador
do mundo.
Em verdade, as
duas crenças não estão presentes nos pressupostos do pensamento contemporâneo.
A mente, como parte indivisível do corpo material humano, não comportaria uma
nova vida pós morte. Esta divisibilidade teria origem na esperteza de um
herdeiro familiar.
Sendo o filho
primogênito o herdeiro ao trono não haveria garantia da continuidade da
liderança. Ele poderia ou não ser dotado de tal virtude. Então, mais simples
era que este se tornasse o oráculo da vontade do líder morto. Então, em anexo a
grande casa da família era erguido um túmulo-templo no qual era praticado um
ritual de oferendas e de escutas da vontade do Pai. O primogênito era o
sacerdote e único ouvinte e interprete da vontade papal. Então, ele governava
em nome do Pai.
O pai depois de
morto se tornara o Pai. Sendo agora muito mais poderoso, pois estava livre do
corpo material que definhava. Ele agora era só alma, e sendo assim, imortal.
As famílias não
conviviam sempre em harmonia de interesses. Claro que haviam conflitos, todavia,
uma ameaça externa, os invasores, poderia e faria se unirem sob a liderança de
um dentre os chefes familiares, este com efetivo dom de liderança. Surgindo,
então, a tribo e uma crença comum, o Pai tribal, protetor de todas as famílias
da tribo, ao mesmo tempo que, como Senhor dos Exércitos, exigia absoluta
obediência.
Grandes Relatos
foram elaborados para dá unidade e sentido a vida da tribo e dos seus membros.
Lendas, parábolas, alegorias, rituais e hierarquia fundamentavam a Ordem.
Muitos séculos se
passaram e a transcendência a vida material foi cada vez mais adquirindo
complexidade e exigindo registro em textos esotéricos, que para a sua exata
compreensão exigi-se uma processo de iniciação, no qual é confiado ao iniciado
a hermenêutica do código. Todavia, a experiência com o transcendental não se dá
de uma única maneira.
Conforme ensina a
tradição, o Transcendente se apresenta a cada um de nós, conforme o grau de
consciência que possuímos. Portanto a experiência com o Transcendente é
diferenciada, dando origem a uma multiplicidade de elaborações e assim gerando
as mais diversas religiões e os seus Deuses.
A maçonaria é
herdeira destes dois princípios: a crença na existência de um princípio
ordenador e na imortalidade da alma.
Reconhecendo o
direito de cada um dos seus obreiros professar a fé na religião da sua livre
escolha e referenciando o princípio ordenador pelo título de Grande Arquiteto
do Universo. Portanto, isentado-se de adotar qualquer nome particular e assim
respeitando todos os acolhidos pelos seus obreiros.
Nesta atitude a
Maçonaria - agora nos referenciando as organizações que se formaram em seu nome
- não adota qualquer tradição religiosa. Preferindo criar o seu próprio Grande
Relato, a Lenda de Hiram.
Neste relato não
é a alma de Hiram que fala ao Grão Mestre da Ordem, orientando-lhe sobre a rota
do caminho. Nem Hiram reencarna ou ressuscita. E nem é necessário uma
hermenêutica particular para o entendimento da lenda.
A lenda de Hiram
apresenta um arquétipo da construção de uma sociedade justa e perfeita baseada
na meritocracia. A construção de Jerusalém Celestial, não pela fé na alma dos
mortos, mas pela razão do vivos. Sem que com esta atitude, esteja relevando a importância das religiões e nem
negando os seus valores morais fundamentados na vontade do Transcendente.
A lenda de Hiram
oferece a cada obreiro um projeto de construção, em que cada um participa em
conformidade com as suas virtudes e suas limitações. Todos tendo consciência do
seu papel e da importância do mesmo. Exatamente o contrário da alienação
denunciada no filme do Charles Chaplin - Tempos Modernos.
Por fim,
respondendo a pergunta que me foi apresentada, a Maçonaria, embora revestida de
toda uma indefinida mística simbólica, que lhe é mal atribuída - exatamente pelos
que não a conhecem - é uma utopia que oferece um sentido de vida baseada em
princípios morais racionais, mediante um Grande Relato da dignidade da condição
humana.
Melquisedec, aos
quatorze dias do mês de Janeiro de 2015 da Era Vulgar.
Loja Alferes Tiradentes Nº 20 > O
papel da Maçonaria na contemporaneidade
15/01/2015 22:58
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