sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

 

AS PRESEPADAS DE ANTONIO SILVINO

 

Histórias contadas pelo estimado primo Baltazar Maracajá, já desencarnando, escrito do jeito dele. (Ipsis litteris).

 

 

Antônio Silvino certa vez atacou com um bando, uma fazenda ou casa. O dono desta casa era um homem valente e destemido. Reagiu até acabar a munição. Então o homem abriu a janela e jogou o rifle e disse:

- Acabou-se a munição. Vamos lutar de homem para homem de arma branca.

            Silvino rebentou a porta, porém antes disse:

- Fique sossegado porque eu não vou fazer nada contra você. Um homem como você não se mata e ficaram amigos.

 

Antônio Silvino veio morar em Campina Grande na rua padre Ibiapina. Esta rua é uma rua estreita onde fica a sede da UCES – União de equipe social, que foi fundada pela irmã Ângela Beleza. A UCES coordena todas as associações de moradores – SABES de Campana Grande e Bairros.

 

Sabemos que Antônio Silvino gozava bastante saúde. Nãos sabemos a causa mortais dele. Porém sei que as últimas palavras que proferiu foram estas ditas para a pessoa que lhe assistia.

- Maria ponha um pano e cubra meu rosto!

 

Antônio Silvino era respeitador, mas justiceiro. Certa vez uma negra e um negro que vivia em certo lugar, começou a falar dele. Ele soube e foi na casa deles e mandou ela e o marido dar três umbigadas num pé de cardeiro.

Se é verdade ou não. Só escrevo porque me contaram.

 

Outras histórias de Antônio Silvino.

Perto da cidade de Areia tinha uma travessia e o povo contou para ele que aparecia malassombroso.

Era a cara de um galego desse sarará com uma espada na mão. Silvino disse:

- Eu tenho vontade de ver esse sujeito para saber quem é ele.

Quando Silvino voltou outro dia deixou o bando e foi sozinho ao local da aparição desejando ver este ente do além e repentinamente o sujeito apareceu sorriu para Silvino e disse:

- Agora eu vou te pegar.

- Silvino sacou do parabélum e disparou várias vezes contra o fantasma, ele nada temeu, Silvino tira o punhal e diz

- Agora o punhal galego nojento.

Ambos se atracaram em luta pois o mesmo tinha uma espada na mão, mas Silvino lembrou-se de Deus e fez uma oração mentalmente e ele desapareceu.    

Dizem que certa vez a polícia cercou Antônio Silvino.   

Ele possuía uma oração oculta que dizia:

Nas mãos dos meus inimigos eu sou vulto sou vela e desvelo, sou vulto e desvulto.

Repetia esta prece por três vezes.

Note bem: esta oração é uma oração esotérica da Cruz de Caravaca.

Faz o Pelo sinal também três vezes.    

Lenda ou verdade, conta que ele ia caminhando e foi cercado. Ele proferiu esta oração e ficou transformado em um toco. Então um soldado disse:

- Eita gente olha fogo ali naquele tronco, vamos acender os cigarros.

Dizem que Silvino mandou um recado para o comandante.

- Olha vocês estão muito atrevidos, os seus macacos estão ascendendo cigarros no meu cigarro.

 

                                  

 

 

                     Contada por Manuel Baltazar Maracajá - Ipsis litteris

 

 

 

 

 

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

 

MEU ENCONTRO COM O CARIRI DA MINHA MÃE

 

Grijalva Maracajá Henriques

(tempos atrás)

 

Quase não lembro dos meus avós. Pequenas recordações ainda guardo até os dias de hoje, década de 2000, quando iniciei este trabalho.

O major era um mito para mim e minha mãe Vinú uma santa que parecia flutuar quando andava; E eu muito pequeno; ainda continuo sendo; mas, não esqueci a alegria que nos dava quando era anunciado que a gente ia passar férias no cariri. Morávamos na capital, João Pessoa. Meu pai, já chegava do trabalho, trazendo novidades. Já havia contratado um tal de carro de passeio ou carro de aluguel como na época se chamava este tipo de transporte. Existiam também uma tal de Sopa, Marinete, Jardineira ou um misto - mistura de caminhão com ônibus - com três cabinas, onde se alojava nos bancos de madeira mais de quinze pessoas, fora, a “passageira especial” do motorista que se aconchegava a sua esquerda. Na carroceria se amontoavam todos os tipos de mangáios, coisas inenarráveis.

Ainda hoje tenho gravado na lembrança as marcas das feras - GMC - BUICK – FORD – MERCURY – STUDEBAKER – CHEVROLET  - PLYMOUTH etc. Os automóveis eram todos pretos, não sei ainda hoje porque, seria luto? De quem? Ou seria ainda pela tal de blecaute, que minha mãe muito tempo depois me contou que na época do meu nascimento, tempo de guerra, até as janelas da maternidade São Vicente de Paula em João Pessoa, eram pintadas de preto e isso durou muito tempo e acho que este preto me acompanha até hoje.

Mamãe “fazia” as bagagens. Papai procurava quem ia tomar conta dos seus centos e tantos passarinhos, e eu, junto com os meus irmãos, os sonhos.

A difícil travessia de João Pessoa à Fazenda São Domingos, fazenda esta que foi sua última morada; parte dela, lhe fora doada pelo Sr. Avelino Henrique e sua mulher Joaquina, para que quando morressem, o Major Raulino tomasse conta de seus filhos; o qual cumpriu até a sua morte. (ouvi contar).

Passando por Campina Grande, para se ver os queridos familiares e inevitavelmente almoçar na casa de tio Heleno ou de Zé Narciso. Gastava-se quase a manhã inteira por causa da trepidação nas estradas, que muita gente chamava de costela de vaca por causa da formação transversal que a erosão causava, ainda hoje não sei por que motivo geológico ou outros ólicos que ainda ocorrem em vários trechos nas péssimas estradas.

Apesar de papai sempre escolher um automóvel dos melhores, a gente sempre enjoava muito. Mesmo usando toda técnica dos dois, o vômito era certo. Minha irmã Ceres era a primeira a dar o sinal de perigo e aí começava o tirinete: queima um fósforo e manda-a colocar na boca - gritava mamãe - e lá da frente muito distante, porque esses carros antigos eram muito compridos e confortáveis, o banco dianteiro, na nossa pequenez inocência parecia muito distante do nosso banco traseiro e papai gritava: respire fundo e coloque-a na janela, era exatamente o que a gente queria. O vômito surgia ligeiro e o desmantelo estava feito. Mais à frente, fazíamos, antes que a gente morresse uma parada num hotel chamado Café do Vento, onde papai nos oferecia um gole de quinado, o qual nos garantia que o enjoo se acabaria, mas a odisseia continuava até Campina.

De lá até a fazenda São domingos, as lembranças me fogem. Só depois fiquei sabendo, por tio Zé Narciso, que a estrada de Campina em diante passava por Soledade, Pendência e Gurjão. A única certeza que tenho, hoje, é que chegava lá montado nos meus sonhos, planejado durante o ano todo.

Esse Major, o qual sua vida vou tentar narrar é meu avô materno; pouco o conheci, poucas vezes lhe pedi a benção.

Era como todo bom caririzeiro, um destemido com as faltas das chuvas, enfrentava as secas, dizia minha mãe: olhando para o céu à procura de indícios nos nimbos ou cúmulos que às vezes apareciam no céu limpo, às vezes o céu se tornava igual ao campo cheio de carneirinhos brancos que a meninada ficava a contar, enquanto se esqueciam da falta de chuvas, que nunca chegavam.

A Fazenda São Domingos, onde primeiro tomei chegada, fica nos arredores de Gurjão, antigamente chamava-se Timbaúba do Gurjão.

Papai nos deixava nas companhias dos meus avós, tia e velhos moradores de saudosa memória. E voltava para a Capital e ao trabalho. Por isso, ficávamos literalmente a pé ou a jumento. Lembro-me bem, sem reclamação e sem vergonha uma aventura daqueles tempos: Uma bela manhã inventamos de ir a Timbaúba montados num jumento. Caetano, braço direito e pau para toda obra do Major foi quem selou o teimoso Ginbau; montamos: Eu no pescoço, Parsival, o mais velho dos três, na sela, comandando e Ceres na garupa se é que jumento a tem. Saímos pensando que estávamos montando algum ser mitológico; Pégaso era o meu, o do Veio talvez fosse o cavalo de Dom Quixote, Rocinante o de Ceres, como sempre reclamando e indecisa, ainda hoje não decidiu a montaria que desejava nos seus sonhos se galopava no cavalo Branco de Napoleão ou o famoso Bucéfalo de Alexandre o grande.  Íamos os quatro satisfeitos e boca aberta na maior alegria do mundo. Não andamos dez minutos e já avistamos a cidade; e entre nós e ela existia um rio seco muito arenoso, que parecia até a praia de Tambaú, era o velho rio timbaúba onde antigamente os desbravadores da Paraíba usavam à guisa de estradas. O animal aproveitando a descida e tentando pegar embalagem para subir a outra margem, disparou; a sela virou e ficamos de cabeça pra baixo, sob o pobre animal que pacientemente não se buliu mais.

Ainda guardo outras lembranças com muito carinho, nas minhas férias em são Domingos: Minha tia Nélia, a única solteira; de manhãzinha colocava um disco de Vicente Celestino, na velha vitrola de corda, onde se ouvia sua potente voz cantando - Acorda patativa e vem cantar. . . – e de repente como num passe de mágica na janela do meu quarto que se abria para o curral aparecia um copo quentinho de leite cru, tirado da vaca preta, escolhida por ela.

De outra feita fui escolhido pelo Major, não sei se por falta do ajudante oficial ou por que quisesse me mostra as coisas maravilhosas do campo. Saímos juntos, ele na frente e eu atrás até o curral que nesta época ficava mais à frente do outro lado da estrada que ia de Timbaúba a fazenda Pendência. A ordem era: controlar a entrada dos bezerros um por um, quando ele acabasse de tirar o leite da primeira vaca e assim sucessivamente, os primeiros bezerros passaram certo, aí, acho que a fome era grande, pois haviam passado à noite trancados em pequeno curral, ou se foi o medo que tive dos bezerros, pois tinha uns que eram maiores do que eu: só sei que de repente todos me atropelaram e passaram de uma só vez, botando tudo a perder, procurando suas respectivas mães e o major me procurando com os arreios nas mãos correndo atrás de mim até ser socorrido por minha querida tia Nélia a mais nova e que morreu solteira.

De vez em quando, ele selava seu cavalo melado me colocava ao pescoço do gigante, mandando segurar nas crinas, depois montava e íamos dá uma volta pela fazenda, - ainda hoje gosto de cavalo e da cor baio. - Passávamos em frete a casa de Chica, Inacinha, e dos outros irmãos, Caetano, Edwiges, Isabel e Joaquina atravessávamos campos e riachos, passávamos por pés de cardeiro, mandacaru, xiquexique, macambira, pereiros, aroeiras, angicos, touceiras de mofumbo, catingueiras raquíticas e tortas, verdes juazeiros, coroas de frades, cheias de sementes vermelhas, palmatórias cheias de espinhos, caminhos cobertos por pedras de todas as cores e formas, que o cavalo ia driblando como podia. Voltava feliz, só pensava como ia contar aos meus coleguinhas, na volta às aulas do jardim de infância, no Liceu Paraibano. Pois, nesta época, dessas minhas primeiras lembranças, morava a Rua Camilo de Holanda em frente ao velho Liceu. Esta casa era de propriedade de meu pai, ao lado existiam dois grandes jambeiros, (ainda hoje adoro jambo) atrás, o quintal era dividido em dois por uma cerca com um portão de madeira. Esta casa ficava em uma esquina ainda hoje existe com pequenas modificações.

Da sua casa, na fazenda São domingos, só me lembro de uma espreguiçadeira de madeira e com pano listrado, uma escarradeira de louça e uma bacia de lavar mãos que formava um conjunto, uns retratos de pessoas nas paredes, que devia ser dos seus pais e avós, uma mesa grande com gavetas e pratos de ágata esparramados, onde comíamos xerém pisado, num velho pilão que ficava fora da cozinha, com leite novinho tirado quase na mesma hora, biscoitos que fazia com muito carinhos em vários formatos, tinha também barricas de madeira que meu avô comprava com bacalhau e que depois eram usadas para conservar carnes de porco untadas com a banha do próprio e que durava por vários meses. Como também a gostosa coalhada, que ele chamava de soro da vida, tudo servido pela minha avó, que carinhosamente, todos a chamavam de mãe Vinú. Num quarto ao lado meio escuro, ficava minha bisavó, mãe do major, já com mais de cem anos, fumando seu cachimbo e chamando nomes com todo mundo, pois já estava caducando – Madrinha Mãezinha – como era conhecida, não chegávamos perto, pois tínhamos medo, vivia sempre reclamando em voz alta. Conta minha prima Norma, que quando em momentos de lucidez ela dizia que antigamente quando se tinha noticia de cangaceiros, seu pai colocava todos os filhos menores em baixo de tigelas para escondê-los. Esta minha querida prima quando pequena era muito “impossível”, tinha a mania de apertar os velhos e decaídos peitos da minha saudosa bisavó, e ela gritava sempre: Diabo! Diabo! Era fato real que sempre que via meu tio Zé Narciso mandava que ele colocasse um cabaré (acho que ele tinha um jeitão pra isso mesmo, pois sempre foi um eterno namorar e bom dançarino). E nas suas lembranças que ninguém sabe de onde vinham também costumava gritar com sua nora, minha avó. Ói o padre, Vinú!

Fui embora. Ainda hoje não parei de ir.

Cresci sem mais contatos com meus parentes caririzeiro, pois fomos morar em outras cidades e em outros estados, e só de vez em quando, nas quatro festas do ano, missa de sétimo dia, enterro ou velório é que nos encontrávamos.

 

 

 


Augusto Dos Anjos


RAÇA ADÂMICA (psicografada)

 

 A Civilização traz o gravame

Da origem remotíssima dos Arias

Estirpe das escórias planetárias

Segregadas num mundo amargo e infame

 

Árvore genealógica de párias

Faz-se mister que o cárcere a conclame

Para a reparação e para o exame

Dos seus crimes nas quedas milenárias

 

Foi essa raça podre de miséria

Que fez nascer na carne deletéria

A esperança nos Céus inesquecidos

Glorificando o instinto e a inteligência

Fez da Terra o brilhante gral da Ciência

Mas um mundo de deuses decaídos

 

 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

 

O vendedor de bassoura piaçava

 


            Zé Bertino vendia vassouras de piaçavas (Leopoldínia piaçaba) na esquina da padaria do seu Anfrísio há muitos anos. Vassoura bem feita, seguras, grandes e não soltavam as fibras. Era boa para todo serviço, durava até se acabar. O preço era tabelado há muitos anos no valor de 10 reais.
            Tinha criado e formados vários filhos com a venda de suas vassouras. Pobre mais honesto, cabra de caráter conhecido por toda a cidade de Mamangava. Todas as manhãs, lá pelas seis horas já estava no seu posto de trabalho, chovesse ou fizesse sol. Levava sempre uma dúzia das bichinhas de cabo bem polido. Sempre feito de resto de madeiras cambará, louro, angelim
ou eucalipto. Todas feitas uniformemente com 1,40 m de altura.
            Certo dia aparece na esquina em frente à padaria do seu Anfrísio, logo depois que seu Bertino tinha feito sua exposição, outro vendedor de vassouras!
Abismado com o desaforo e a coragem do desconhecido, seu Bertino quase tem um troço. Senta-se no seu velho tamborete feito de massaranduba e fica espiando para o inesperado inimigo.

 

— Que diabo está acontecendo com o mundo?

 

— Quem mais tem o direito de fabricar vassouras boas e dos preços que vendo?

 

— Quem é o safado com tanta audácia?

 

            Lá do outro lado o cabra grita bem alto! Provocando mesmo seu concorrente.


— Vassouras boas e baratas ao preço de nove reais!


— Não acredito no que estou ouvindo.

 

— Esse picareta pensa que pode comigo, vai ver o que é saber negociar.


            No outro dia, seu Bertino colocou uma cartolina com os seguintes dizeres: vassouras da legítima piaçava por oito reais. Quando o safadório do Chicuca viu a tabela com o novo preço do seu Bertino, gritou bem alto!


— Vassouras da melhor qualidade, só hoje pelo preço de sete reais.

 

— Não percam essa oportunidade.



            Pronto! Seu Bertino teve um faniquito grande e teve que ser socorrido pelo dono da padaria. Foi para casa. Doente e arrasado com o mundo cruel e ingrato. Durante a noite matutou um jeito de acabar com essa concorrência desleal e ingrata. Chamou um dos filhos e bolou uma nova estratégia.

            Logo cedo, antes do seu oponente chegar, colocou uma nova cartolina com o preço de 6,00 reais em letras bem grandes e posicionou o menino bem na frente do local onde Chicuca ficava; orientado para gritar bem alto o novo preço, logo que o bandido e sem caráter abrisse suas vendas. Mas, o vendedor oponente já chega com duas vassouras nas mãos, tomando a frente das pessoas que passavam gritando.

 

 


— Vassouras melhor do que essas não existem.

 

— O preço caiu, agora são cinco reais cada.


            Nesse dia seu Bertino não vendeu uma sequer. Juntou as bichinhas debaixo dos braços e seguiu cabeça baixa puxando o filho pelo braço, como se ele tivesse culpa.


            À noite dona Francisquinha, vendo a situação do esposo, reúne a família e pedem que ele deixe esse negócio de vassouras, pois, além do trabalho de fazê-las ainda tinha, agora, que enfrentar um negociante sem escrúpulo.


— Não posso parar com esse trabalho, só sei fazer isso e não darei o direito de um malfazejo zombar comigo. Vou a até as últimas consequências, mas não desisto.

 

            Pei bufo! De manhã estavam os dois nos mesmos locais, um olhando para o outro.
Zé Bertino gritava.


— Vassouras ao preço de banana. Custam apenas quatro reais.


Chicuca, com um riso cínico e debochado gritava por sua vez.


— Vassourinha das boas, maneirinhas e bem acabas. Promoção no momento três reais.
Mais um dia e uma noite nessa expectativa para ver quem vencia ou quem parava de baixar os preços primeiro.


            Amanheceu nublado e querendo chover. Seu Zé Bertino pensou. Acho que ele hoje não vem. Lá não tem onde se amparar da chuva. Tomara que esse sujeito dos quintos dos infernos não apareça.


            Aperreado, seu Zé leva a mão a pala e fica olhando para todos os lados para ver se descobre entre os transeuntes, o descarado com seu mói de vassouras aos ombros.
Pois, não é que o avista caminhando em sua direção. Sente um nó na barriga e um frio correndo pelas batas das pernas. Quis se sentar ou bater em retirada, mas tinha decidido ficar e ver no que ia dar aquela peleja descabida. E foi logo começando aquela ladainha de venda.


— Vassouras de piaçava, preço imperdível, só dois reais, são as últimas, não percam essa oportunidade.


            Dizendo isso e já com a certeza que o cara não podia mais baixar o preço e, já antecipando sua vitória. Ouviu alto e de bom som, aquele grito desentoado do enxerido Chicuca.


— Vassoura hoje é de um real, se aproximem e leve o instrumento mais útil de uma casa, varre sujeira do chão e das pessoas também.


            Seu Bertino, quase chora. Os olhos ficaram vermelhos, quis espumar, o zumbido dos ouvidos aumentou com a pressão lá pelos 16, quis gritar, mas só saiu um urro abafado pela boca travada da raiva incontida.


            Partiu feito demônio para cima do seu oponente. Ia esganar o filho do belzebu. Já no meio do caminho Lembrou-se da mulher e dos filhos e respirou três vezes e diminuindo os passos, rezou rapidamente uma Ave Maria e então seus impulsos esfriaram e com a calma veio o raciocínio.

— Bom dia, meu senhor. 

 

— Queria conversar com vosmecê calmamente sobre os nossos negócios.

 

— Há muitos anos que faço vassouras de piaçava. Retiro esse material das terras do Dr. Eusébio sem pagar nada.

 

— Os pregos usados cato dos caixões que são jogados no lixo do armazém de seu Damião.

 

— As aspas que serve para prender o conjunto vem da oficina de seu Abílio mestre funileiro que não me cobra nadinha; a madeira para os cabos e a base de sustentação tiro pelas fazendas da redondeza.

 

— Então só entro com o meu trabalho da confecção e a venda. É como se tudo fosse roubado por isso, posso vender muito barato, no entanto, não sei como pode vender tão em conta.


— Meu caro senhor posso vender mais baixo do que os seus preços, porque uso de outra técnica muita mais lucrativa e eficiente. Eu já roubo a vassoura pronta.

 Grijalva Maracajá Henriques

 OS POETAS NUNCA MORREM

 

Augusto dos anjos continua vivo e produzindo seus maravilhosos poemas. Dizem que numa certa época, quiseram trazer os restos mortais da cidade acolhedora onde jazem seus restos mortais, para sua cidade natal. (Nasceu no Engenho Pau d'Arco, atualmente no município de Sapé, Estado da Paraíba.)

Como resposta ao translado dos seus ossos, respondeu com esses versos abaixo, lá do além, através do médium Francisco Cândico Xavier.

 

RECORDAÇÕES EM LEOPOLDINA

 

A sombra amiga destes montes calmos,

Meu pobre coração de anacoreta,

Amortalhado em fina roupa preta,

Desceu à escuridão dos sete palmos.

 

Viera o fim dos sonhos intranquilos,

Entre grandes e estranhos pesadelos,

Satisfazendo aos trágicos apelos

Da guerra inexorável dos bacilos.

 

A morte terminara o horrendo cerco,

Sufocando as moléculas madrastas...

Eram milhões de células nefastas,

Voltando à paz do túmulo de esterco.

 

Indiferente aos últimos perigos,

Meu corpo recebeu o último beijo

E comecei o lúgubre cortejo,

Sustentado nos braços dos amigos.

 

Em triste solilóquio no trajeto,

Espantado, fitando as mãos de cera,

Rememorava o tempo que perdera,

Desde as primárias convulsões do feto.

 

Porque morrer amando e haver descrido

Do Eterno Sol, do qual vivera em fuga?

Como é sombrio o pranto que se enxuga

Pelo infinito horror de haver nascido!...

 

Depois, vi-me no campo onde a dor medra,

Ao contato do chão frio e profundo,

Chegara para mim o fim do mundo,

Entre as cruzes e os dísticos de pedra.

 

Terrível comoção pintou-me a cara,

Na escabrosa cidade dos pés juntos,

Tornara-se defunta, entre os defuntos,

Toda a ciência de que me orgulhara.

 

Trêmulo e só no leito subterrâneo,

Sentia, frente à lógica dos fatos,

O pavor dos morcegos e dos ratos,

Dominar os abismos de meu crânio.

 

Meus ideais mais puros, meus lamentos,

E a minha vocação para a desgraça

Reduziam-se a mísera carcaça

Para o açougue dos vermes famulentos.

 

Em seguida o abandono, enfim, do plasma,

Os micróbios gritando independência...

E tomei nova forma de existência

Sob a fisiologia do fantasma.

 

Fugindo então ao gelo, à sombra e à ruína.

Do caos sinistro em que vivi submerso

Revelou-se-me a glória do universo,

Santificado pela Luz Divina.

 

Oh! Que ninguém perturbe os meus destroços,

Nem arranque meu corpo à última furna,

É Leopoldina a generosa urna,

Que, acolhedora, me resguarda os ossos.

 

Beije minhalma alegre o pó da rua,

Deste painel bucólico e risonho,

Onde aprendi, no derradeiro sonho,

Que o mistério da vida continua...

 

Bendita seja a Terra, augusta e forte,

Onde, através das vascas da agonia,

Encontrei em mim mesmo, em novo dia,

Pelas revelações de luz da morte.

domingo, 31 de julho de 2022

 

Conversa Fiada

 

Engenho Burra Leiteira, ficava no Município de Carambola. Lugar onde o cão perdeu as esporas. Da sede municipal para lá, fica umas três léguas de beiço, que se fosse medir daria bem umas quatros. No entanto, a fazenda possuía muita terra boa de cana de açúcar que produzia boas rapaduras com um doce insuperável; talvez pelas terras de massapê. Dava emprego a muita gente das redondezas. Todo mundo já tinha sido morador do engenho. Era quase um oásis. O velho engenho funcionava, já havia vários anos, a força de éguas e bois mansos.  Passado de pai para filho, acho que vinha dos tempos dos Afonsinhos. O atual proprietário era o coronel Marsurpião Pinto Barbosa dos Anzóis Pereira, filho único. Cabra sem cabresto. Não valia o que o pinto come. Mas mesmo assim era respeitado por toda aquela região sem lei e sem ordem. Era o delegado, Juiz e promotor. Parteiro, médico, farmacêutico e dentista e nas horas precisas e urgentes, virava padre.

Casou-se com uma moça prendada lá da capital, quando fora estudar pra ser gente, porém seus miolos não ajudaram e voltou sem diploma, mas com uma certidão de casamento bem passado.

Dona Anfrosina era feia, mas tinha seus encantos secretos e filha de pais bem possuídos nos bens. Ele também não era lá uma flor para se admirar. Tinha uma cara mais parecida com jumento novo. O casamento foi um encontro do destino desalmado.

Afinal de contas quando o velho pai bateu a caçoleta, ficou senhor de engenho. Coronel. Título que naquela época passava de pai para filho, para os menos avisados.

Botou o negócio para funcionar às mil maravilhas, no entanto, sua querida e submissa esposa não botava menino pra fora. Passava o tempo e nada. Foram até aos médicos da capital tentar uma solução. O médico aconselhou dormir numa rede e botar fogo em baixo. Nada!

 A mulher dizia que o problema era com ele. Por sua vez dizia que ela tinha vergonha de se mexer. Fogo morto no casamento. Nem um bruguelo pelo menos.

O homem queria um herdeiro para eternizar seu poderio nas terras de meu Deus.

O cabra então começou a pular fora do ninho pensando que era ele que tinha o ovo goro e para provar e não servi de mangação para os amigos e parentes virou um bode danado. Não podia ver uma saia se mexer que caia em cima. Principalmente as filhas dos moradores. Dizia que mulher é como miunça, deu no couro... Não escapava nada. Era o rei dali.

Um dia, chega seu Zenobio com a família para trabalhar nas terras do seu coronel Pinto como era mais conhecido. Ele a esposa Bertina e a filha Rosa de Judá, criada com todo o mimo que um casal podia dar a uma filha. Quinze anos de beleza e de doçura.

Um belo dia Bertina chama Zé e lhe diz. - Buliro com Rosa!

- Quem foi o fio de uma égua que fez isso com Rosinha. Vou matar esse desgraçado. Vou sangra e tirar até a última gota de sangue desse bandido.

- Foi o coroné!

- Vou agora mesmo tomar satisfação com esse velhaco.

Partiu em procura da casa grande do engenho. Pediu para falar com o coronel.

- Entre e sente seu Zenobio, o homem vem já – Disse sua dona Anfrosina.

- Bom dia meu cidadão. Tudo em paz? O que é que manda? Estamos as ordens. Que uma aguinha fria com pedacinho de rapadura?

- Não senhor. Vim tratar de um assunto muito sério. Vim dar uma denúncia ao senhor.

- De jornal?

- Não senhor!

- Vim dizer que ofenderam minha filha.

- Comeu alguma comida estragada?

- Não senhor!

- Vim dizer que defloraram minha filha!

- Oxente. Mulher vem cá. O engenho agora vai melhorar, vai passar trem por aqui vão derrubar muita mata.

- Não senhor. Vim dizer que comeram minha filha.

- Vigi meu Deus, com farinha?

Seu Zenobio, levantou-se e saiu sem olhar para trás. Ganhou o oco do mundo com Bertina, Rosinha sua querida filhinha e mais um herdeiro do coronel dono do engenho Burra Leiteira.

Granja Lírio do Brejo, 20 de novembro de 2021 as 19.40 horas.

Grijalva Maracajá Henriques

(Lembranças do Sítio Cerquinha das laranjas em Penedo Alagoas e de seu Zé Vicente com suas histórias engraçadas)

domingo, 6 de fevereiro de 2022

VIDAS NORDESTINAS

 



Até que enfim o livro de João saiu. Até que enfim a “montanha pariu”, não um rato; mas nossa gente vivida por ele.

 

João Henriques da Silva, nasceu na fazenda Arara, município de Esperança-PB, no dia 20 de setembro de 1901 e desencarnou em 16 de abril de 2003, na cidade de Maceió-Al.

Estudou em vários educandários e até no Seminário Maior de João Pessoa, quase que virava padre, mas resolveu cursar a Escola Mineira de Agronomia e Veterinária de Belo Horizonte, formando-se agrônomo em 1923. Ainda em Minas Gerais teve que cumprir com as obrigações militares, sendo incorporado em 11 de maio de 1923 na 8ª brigada de Infantaria do 2º batalhão da 7ª Companhia. Ficando no Exército até 1924.

Sua vida profissional “pelo o amor ao campo” foi bastante longa: Em 13 de outubro de 1925, foi nomeado para o Ministério da Agricultura/ Paraíba e Pernambuco, onde permaneceu até o dia 24 de outubro de 1983. Nesse ínterim por duas vezes foi agraciado com o título de “agrônomo do ano” nos governos de Getúlio Vargas e José Sarney.

Dentro desse período ainda, trabalhou por muitos anos no Departamento de Produção, do Governo do Estado da Paraíba, exercendo várias funções. Ao se aposentar, passou poucos meses inativo de suas funções como agrônomo, pois logo foi convidado para dirigir a Companhia de Progresso Rural no Município de Coruripe, Alagoas. Logo depois foi convidado para trabalhar na Suvale/Codevasf, encerrando sua carreira de 58 anos como profissional da agricultura aos 72 anos de idade, quando se retirou definitivamente do serviço público.

Como produção intelectual e científica, escreveu um dos primeiros livros sobre a cultura do Caroá, trabalho que foi requisitado em 1938 pelo A Gray Herbarum da Harward University – Cambridge, Massachusetts-USA. Uma segunda publicação sobre o Caroá de sua autoria foi editada em 1937, no Rio de Janeiro, pelo Departamento Nacional de Produção Vegetal do Ministério da Agricultura. Também escreveu artigos para o Boletim da Diretoria de Fomento da Produção Vegetal e de Pesquisas Agronômicas, por vários anos publicou artigos sobre agronomia no Jornal A União e ainda participava de muitos programas de rádios tirando dúvidas de agricultores, tanto na Paraíba como em Alagoas.

João Henriques  também foi professor da cadeira de Defesa Sanitária do Algodão e Estatística no Estado da Paraíba, professor da Faculdade de Formação de Professores – FEBSF- Alagoas, Representante da Sociedade de Agricultura da Paraíba, sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico Parahybano, sócio correspondente do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, membro do Rotary Club, do Lions Club de Penedo e deixou no prelo um legado literário inédito, de dois romances e cento e cinquenta contos e poesias.

Foi bem casado. No dia 10 de novembro de 1928 entrelaçou-se e se arrastou por quase setenta e cinco anos. Dessa aventura nasceram os filhos Robério, Níobe, Parsival, Ceres, Grijalva e Isis e uma danação de herdeiros.

 

 

 

 

sábado, 25 de dezembro de 2021

 

Conversa Fiada

 

Na longínqua cidade de Urubueta, dentro do polígono das secas, com uma população estimada em mil almas penadas, havia um sacerdote muito sabido e espertalhão. Cabra velho vivido em muitas paroquias abandonadas pelo alto clero do Estado. Sabia tirar mesmo leite em pedra para sobreviver e também se manter com dignidade. Era festa todo os meses. Quermesses, procissões, reformas na igreja e casa paroquial. Cada dia era comemorado um santo ou uma santa. Haja dinheiro no cofrinho. Vendia-se de tudo na paroquia, objetos doados e feitos por fies abnegados. O padre dava nó até em pingo d´água.

Chegou até mudar o nome do padroeiro da cidade. Deu briga, mas conseguiu nomear seu santo querido à frente da igreja: São Cipriano!

“Salve São Cipriano, fazei que muito dinheiro, riqueza e fortuna fiquem para sempre comigo. São Cipriano trazei muito dinheiro, riqueza e fortuna pra mim. Assim como o galo canta, o burro rincha, o sino toca, a cabra berra, assim tu São Cipriano hás de trazer muito dinheiro, riqueza e fortuna pra mim. Assim como o sol aparece, a chuva cai, faça São Cipriano, o dinheiro, a riqueza e a fortuna serem dominados por mim, assim seja.”

Antes e depois da missa, fazia essa oração juntamente com todos presentes em voz alta. Dizia que era para a cidade progredir.

Zé Pezão e sua mulher Jupiara, já estavam cansados de soltar dinheiro suado do trabalho na roça para a igreja do padre Justiniano. Todo mundo falava dos exageros mais ninguém tinha coragem de falar abertamente desse desregramento paroquial.

- Mulher, vamos armar uma arapuca para pegar esse fela da gaita. O povo é besta e vai cair no conto do vigário que ele mesma vive pregando.

A sociedade Urubuetamense se reunia duas vezes por dia na pequena pracinha em frente à igreja, à sombra de muitos pés de figueiras (fícus benjamim), duas vezes por dia. Uma depois do almoço e outra antes que o sol levasse de vez sua luz para o outro lado do mundo.

- Bom dia senhores. Que a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com vocês.

- Com o senhor também seu Zé.

- Tenho duas notícias para dar. Uma boa e uma ruim. Qual dou logo?

- A ruim!

- Pois bem. O avô de minha mulher morreu lá pras bandas de Dois Riachos. A gente nem se conhecia bem. Mandaram um parente avisar. Morreu de velho. Fazendeirão.

- Homem, dê logo a boa!

- Deixou de herança para minha mulher, sua única neta um bom valor em dinheiro. Uns setenta mil pilas. Vamos ter que ir buscar naquele mundão. Não sei se vale tanto a pena.

Zé Pezão armou a jogada e desapareceu por uns dias das reuniões na pracinha. Trancado em casa com dona Jupiara, só abria a porta da casa do sítio à noite para tomar um arzinho fresco.

- Bom dia rapaziada. Estou de volta. Fui buscar o dinheiro da herança. Está bem guardado no baú à sete chaves. Não sei o que vou fazer com tanto dinheiro. Numa seca dessa a gente não tem como aplicar. Estou pensando em pedir para o padre Justiniano guardar. Dentro da igreja está mais seguro do que no banco.

E assim, todos os dias comenta sobre essa possibilidade de passar o dinheiro “fantasma” aos cofres da igreja. Todo dia esse assunto era comentado debaixo das figueiras.

- Pronto! Entreguei hoje cedo o dinheiro da herança para padre Justiniano tomar conta. Só irei tirar os nossos setenta pilas quando aparecer uma casa ou uma fazenda boa para vender.

Enquanto isso o padre dormia de toca. Não sabia o que Zé Pezão e a mulher estavam aprontando para o espinhaço dele.

Passaram-se uns meses. Antônio Rufino morre e a viúva quer vender a propriedade para ir morara com uma filha na capital. Zé Pezão vai a ela e acerta a compra.

- Pois é comadre, domingo na missa vou pedir o dinheiro que está com o santo padre. Não quer deixar com ele guardado, está em boas mãos.

- Não senhor, minha filha vem me buscar e quero levar em mãos.

Domingo ensolarado, havia dado uma chuvarada dias antes e todos os fies tinham vindo à missa agradecer a são Pedro. A igreja estava coalhada, não faltou um morador por mais longe que morasse.

O padre quando viu aquela multidão dentro de sua paroquia, riu baixinho. Hoje a sacola enche. Ledo engano. Não sabia o que vinha pela frente. A missa termina e como sempre fazia, ia para a frente da igreja agradecer a todos. Porém a turba ficava o mais tempo possível no átrio da igreja revendo os amigos e bajulando o sacerdote simpático.

- Bom dia querido padre, disse dona Jupiara.

- Bom dia como vai de saúde e o seu José?

- Estamos bem graças a Deus. Mas hoje vim tratar sobre o dinheiro. Como sabe seu Rufino morreu e dona Margarida quer vender as terras e a gente já acertou em comprar.

- Que dinheiro a senhora está falando?

Nisso todos os presentes se aproximaram mais ainda do padre para ouvir a história.

- Oxente padre do dinheiro da herança que recebi do meu avô e lhe entregamos para guardar.

- Vocês estão ficando doidos, nunca soube desse dinheiro e nem fiquei com ele tempo nenhum.

- Seu vigário – disse o homem mais velho e conceituado do local – todo mundo sabe que o senhor está guardando os setenta mil da herança de dona Jupiara. Pode perguntar a quem quiser.

- Foi sim senhor – falou a velha barata da igreja.

- Até você quer infernizar minha vida. Sei lá dessa história sem pé e nem cabeça. Coisa mais chata. Vocês estão querendo brincar comigo, não é?

Saiu de supetão, empurrando que tava na frente e sem dizer mais nada, emburacou de igreja a dentro. Passou uns três dias amuado sem aparecer nas ruas.

Dias depois, Zé Pezão com dona Jupiara apareceram na hora do bate papo na pracinha em frente à casa paroquial. Bateram à porta e apareceu dona Deolinda, encarregada de todos os afazerem do padre. Queremos falara com o senhor vigário.

- Padre tem gente.

Quando Justiniano botou a cara na meia porta e avistou o casal foi logo gritando.

- O que diabo vocês querem comigo?

- Bom dia seu vigário, apenas viemos pedir nosso dinheiro. Precisamos dele para fechar um negócio, como combinamos.

- Vão pra baixa da égua com essa história de dinheiro. Quem já viu uma coisa dessa! Onde foi que vocês me deram valor nenhum para guardar. Quando olhou para mais distante viu que as pessoas estavam ouvido sua conversa, ficou mais irritado ainda e bateu a parte de cima da porta.

Os comentários nas ruas e na própria igreja, nos dias de missa, continuaram. Da bancada que fica bem na frente, o casal fazia gestos com os dedos pedindo a grana.

Dinheiro que era bom foi sumindo das sacolas e das caixas dos santos. As festas foram diminuindo e os comentários aumentando. O velho padre não aguentou mais a pressão e mandou chamar o casal.

- Bom dia seu vigário.

- Bom dia uma ova. Vocês são dois ladrões safados.  Vão arder no fogo dos infernos pelo resto da vida. Vou amaldiçoar vocês e nunca mais pise nos degraus dessa Santa Igreja. Tome aqui seu dinheiro, seu não, filhas duma puta. Dinheiro suado durante a vida toda e agora ver sendo levado pelos filhos de belzebu.

No outro dia logo de madrugada o casal fechou a porta do seu sitiozinho e caíram no mundo. Nunca mais ninguém ouviu falar deles.

 

Granja Lírio do brejo, 21 de novembro de 2021 – as 19.12 horas.

Carijalva

(Histórias que ouvia meu pai contar tempos atrás)