OS TEMPOS MORTOS
Grijalva Maracajá Henriques*
Reportagem do passado
O Crime
do frade
Bica dos Milagres
SÉCULO XIX
1801
31 de Julho
Capital da Paraíba
“Neste dia a população da Capital é
alarmada pela notícia de um grande crime, commettido na madrugada deste mesmo
dia.
Em toda a cidade fallava-se e
commentava- se, que na Bica dos Milagres, no sítio dos frades de S. Francisco,
estava um cadáver de mulher entre as unhas de gato, arbusto ali muito abundante, farejado pelos urubus.
Sabedora a policia, immediatamente
foi ao dito lugar e effectivamente encontrou o cadáver, abrindo logo a devassa
respectiva.
Procedido o corpo de delicto
evidenciou-se um crime e pelo reconhecimento, soube-se que a mulher chamava-se
Thereza; tratou então a policia de descobrir o autor ou auctores de semelhante
attentado.
Corria na cidade que a dita mulher
vivia em companhia de Fr. José Lopes, do Convento de S. Francisco, que como
quase todos os frades de seu tempo, era corructo e atrevido.
Neste ínterim, vai uma denuncia da
existência de uma filha desta mulher que assistira o crime e estava em casa
perto do Convento.
O Juiz manda buscar a creança,
enterroga-a, e pela sua confissão, apura-se o seguinte:
Fr. José Lopes vivia effectivamente
com a parda que já tinha tido esta filha de outro homem.
Um
dia , ou porque soubesse ou
visse qualquer cousa, o frade enciumado até o extremo, resolveu acabar a vida
de Thereza.
Convidou-a para banhar-se na Bica
acima citada e esta attendendo ao convite, la se fora com a sua filhinha Anna,
de três para quatro annos, a meia noute, satisfazer o desejo do frade.
Ali já se achava o preto escravo do
convento, Francisco e um índio da Bahia da Traição, chamado José Ignacio.
O
crime foi commettido em um momento, e é de tal barbaridade que faz arrepiar as
carnes: introduziram na cavidade intra pubiana da mulher, um pão que a
traspassou.
A
creança atirada também viva nas unhas de gato, poude escapar e por este facto ficou conhecida por Anninha
Rebollo.
O
frade foi condemnado a prisão perpetua no Convento da Bahia onde acabou os seus
dias, tendo igual sorte os seus comparsas nas cadeias desta Capital.
Encontrei
sobre o facto os seguintes documentos:
Carta
do Commissario Provincial dos Franciscanos, sobre a prisão de Fr. José Lopes.
Convento de S. Antonio do Recife 30 de setembro de 1801. Fr. Luiz de Santo
Antonio.
Carta
do Provincial dos franciscanos em resposta a remessa que se lhe fez do Pe. Fr.
José Lopes. Convento de S. Francisco da Cidade da Bahia aos 8 de março de 1802.
Fr. Francisco de S. Rita.”
Copiado ipsis litteris.
Esta história citada por Irineu
Ferreira Pinto era relatada pela filha de Tereza, Aninha Rebolo até sua morte
aos quase noventa anos de vida.
Essa velha fonte ainda existe, porém
está encoberta no muro de uma residência à Rua Augusto Simões nº 59, antigo
Beco dos Milagres.
Este foi um dos
primeiros mananciais público (que se tem notícia) que serviu à população da
Capital. A fonte era situada no sítio do Padre João Vaz Salem, primeiro vigário
da freguesia de Nossa Senhora das Neves, onde fica hoje o Mosteiro de São
Bento, fora doada aos mesmos no dia 19 de setembro de 1599. Posteriormente construíram
um chafariz no Governo do presidente Frederico Carneiro da Cunha. Em 1848 foi construída uma fachada. Esta fonte era
também conhecida como “Bica dos Milagres”. Possuía duas torneiras de bronze
ladeadas por colunas de pedra.
Na antiga lápide
ainda se lia a data de sua última restauração que datava de 1849.
Bibliografia:
Datas e Notas para a
História da Parahyba por Irineu Ferreira Pinto, volume I – Imprensa Official –
Parahyba do Norte 1908. P.219/221.
Sites:
[http://paraibanos.com/joaopessoa]
http://www.cagepa.pb.gov.br/portal/?page_id=54
*O autor é historiador
e pesquisador.
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