quarta-feira, 16 de abril de 2014

O mestre Amaro


O mestre Amaro*

 
                                                                      João Henriques da Silva

(In Memoriam 20/09/1901 – 16/04/2003)

 

**O conto de hoje que transcrevo é em homenagem ao meu pai que desencarnou, há onze anos passados, com quase 102 anos. Lúcido e com uma saúde de bicho, apenas findara o seu tempo de luta aqui na terrinha. Quem quiser saber se suas histórias são verdadeiras é só ir encontrar-se com ele e tirar suas dúvidas!

               O mestre Amaro tinha a cabeça como um granito. Era inútil querer mudar as suas idéias. Fincava o pé na parede e dali ninguém o tirava. Obstinado como era por isto mesmo vivia só. Solteirão e teimoso. Ninguém conhecia parente seus e muito menos de onde havia vindo. Nunca falava nessas coisas.

            Sabia-se apenas que existia e não dava o braço a torcer. Não encolhia, nem esticava. Resistência do tempo de pé de serra.

            Chegara a um grau de velhice como se Nosso Senhor houvesse congelado sua idade. Dali parecia não sair. Mais um ano que chegasse parecia não lhe alterar o vigor nem as convicções.

            Mesmo assim, todos gostavam do velho Amaro, de quem também não se conhecia o sobrenome. Poderia ser: Ferreira, Prudêncio ou Moreira, tanto fazia.

Também não aparecia em Macambira, alguém que o reconhecesse. Dava até a idéia que havia caído de algum planeta de lá das bandas do infinito. E não adiantava fazer sondagens, pois, não soltava nem um peido...

            Homem esquisito, como nunca se havia visto. O que era curioso é que fumava, bebia moderadamente e não perdia festas que estivesse dentro do seu figurino social. Também não era mão fechada. Usava uma profissão limpa e honesta: Marcenaria.

No ramo era especialista. Fosse uma porta, uma janela, um brinquedo para a garotada, tudo fazia com perfeição e entregava invariavelmente na data marcada.

Só uma coisa não fazia nem a peso de ouro, que era caixão de defunto. Nem queria ouvir falar. Quando passava em frente a uma casa mortuária virava a cara para um lado e fechava os olhos. Nem conseguia entender como havia quem se dedicasse a uma profissão tão fúnebre.

Se passava um enterro pela sua porta, batia a janela ia parar no fundo do quintal.

Tudo que cheirasse a morte e no outro mundo lhe apavorava. Quando um dia foram convidar para o enterro do velho vigário já aposentado da paróquia, colocou a mão nos ouvidos e desapareceu.

Ninguém sabia a razão, que era seu grande segredo. Havia escapado de ser enterrado vivo, por um milagre.

Tivera um troço, foi considerado morto, e quando despertou estava dentro do caixão, cercado de quatro velas acesas e o povo do velório rezando uma ladainha.

Não era para menos, um quadro daquele. Nunca lhe saíra da memória a idéia de ter despertado debaixo de sete palmos de terra, sem ter por quem gritar, isto é, sem alguém para ouvi-lo e salva-lo. Não poderia haver desespero maior.

É por isso, sempre pensava que enterro só deveria ser feito quando o defunto estivesse fedendo. Perto dele ninguém falava em coisas mortuárias. Dava no pé.

O velho Amaro, cinqüenta anos, não envelhecia. Zelava-se. Não fazia excessos. Nem no trabalho nem nas diversões. Tudo era bem medido. Fazia barba diariamente, não relaxava o corte de cabelo e tinha nojo de quem usava bigode, costeletas ou cavanhaque. Considerava imoral.

Não usava gravata, nem sapato apertado. Eram incômodos e atrapalhavam a circulação. Da mesma forma cinturão apertado. O seu era só para compor.

Cômodo mesmo era o suspensório, que não fazia pressão e deixava todo o corpo arejado. Era outra coisa muito mais saudável. Desde muito cedo conservava o hábito de fazer economias sem quebrar o seu ritmo de vida.

De tudo quanto ganhava líquido, guardava vinte por cento. Nem lhe fazia falta e era uma garantia para quando chegasse à fase de não poder mais trabalhar ou satura-se da profissão.

Mensalmente aquela quantia e algumas sobras iam render juros no banco. Não devia a ninguém e nem vendia fiado. Preferia dar. Quem vendia fiado, vez por outra perdia o dinheiro e o amigo.

E já havia passado pelo que passara o certo mesmo era não ter qualquer contrariedade.

O velho Amaro gostava de mulheres. Tinha sempre, sigilosamente, seus “quebras-resguardo”. Embora não tivesse a quem prestar contas, além da sociedade, gostava de ser cauteloso. Para esse lado não confiava em amigos. Não podia haver confiança, quando se fala em mulher. Sempre o diabo atenta.

Mesmo sem se prender a nenhuma, não aceitava dividir o pão com seu ninguém. E quando percebia que a sua preferida pestanejava para alguém, desfazia logo o ninho.

Sem esperar o velho Amaro, conheceu Mirícia, mulher nova ainda e reservada. Parecia até demais para ele, mas a diaba passou a querer-lhe bem. E fazia questão de repetir-lhe que era ele o segundo homem de sua vida. Abandonara o primeiro porque gastava com as outras, enquanto sempre lhe fora fiel. Afinal de contas passara a não lhe dar atenção.

Foram apenas alguns meses de convivência. Menos de um ano. Havia jurado não se ligar mais a outro, embora tivesse que curtir a solidão. Não estava se oferecendo, confiava e gostava do velho Amaro. Poderia ser uma ligação para sempre. Não o faria por necessidade financeira, mas exclusivamente para ter um bom companheiro que atendia os seus desejos de mulher ainda moça. Não pesava em casamento. Não tinha essa pretensão. Precisava sim, de afeto e de alguém a quem pudesse dizer que pertencia.

Os bordados e costuras que fazia eram suficientes para não necessitar de vender amor. Além disso, não era nenhuma mariposa. Havia sido apenas, uma criatura infeliz em sua primeira experiência.

Que ficasse com ela até quando sentisse que deveria terminar. Não queria entrar e sair de homem em sua vida. E deveria ser horrível receber alguém que não se deseja. A não ser alguma sádica ou depravada.

O velho Amaro saiu rezando o credo. E contra os princípios, pela primeira vez sentiu uma pontinha de ciúme. Mirícia lhe parecia uma criatura inteiramente diferente das outras, mas se não fosse. E aquela confissão, aquela fraqueza fosse simplesmente um ardil?

Poderia ser uma espertinha preparando o lance. E o pior de tudo é que não tinha a quem pedir informações. Encontrou-a por acaso em plena feira, na mesma barraca, comprando as mesmas coisas. Foi ali o começo e o “apareça lá em casa”. Está aí o meu endereço. Vivo sozinha, esquecida do mundo. Conversaremos um pouco.

Mirícia estava ali há pouco tempo. Saíra de sua terra para não ver o ex-companheiro que prometera tudo e tudo lhe negara. No entanto lhe parecia sincera, simples e necessitada de amor.

Havia sentido isto muito bem. E ficou visitando-a. Ninguém batia a sua porta, ninguém a procurava. Não havia mais dúvidas de que Mirícia era uma mulher honesta. E nessa vai e vem, aconteceu o inesperado. Mirícia engravidou. O mestre Amaro de nada desconfiou até que Mirícia não teve mais como ocultar.

- O que é isso Mirícia? Estás ficando gordinha e com uma feição diferente, mais pensativa. Aconteceu alguma coisa?

- Sim, aconteceu. Peguei um filho sem esperar. Mais foi um descuido bom. Gostaria tanto de ser mãe, mas pensava que era incapaz de gerar. Foi naquele dia, creio que desfaleci de amor. E é isto que me dá maior felicidade.

Jamais havia me doado com tanto prazer. Foi como se houvesse casado com um príncipe encantado e tivesse vivendo o melhor sonho de minha vida. Até então, juro-lhe não conhecia o verdadeiro amor. Antes, tudo não passava de um ato, puramente carnal. Mas naquela noite para cá era como se estivesse me entregando de corpo e alma, mais alma do que corpo. E agora que serei mãe, sou uma mulher tão feliz como as outras. Deixarei de ser só. E só o que peço a Deus é que não seja uma mulher para não, por desventura, ter que amargar os dias de minhas tormentas e desilusões.

Minha única preocupação tem sido uma coisa que guardo em segredo. Mas não deve haver segredo entre nós. Pelo menos não deveria haver.

É uma coisa que não te diz respeito, nem de longe e peço que me perdoes em não revelar.

- Mas Mirícia, isto me deixa numa terrível dúvida. Tiras-me a parte da felicidade que me pertencia. Suponho que teu segredo é simplesmente algum zelo de tua parte. Não queres me magoar, talvez.

Será que esse teu filho não é também meu. Que não tenho metade dele. Que no momento de minha maior alegria, tenho também minha maior desilusão? Queria tanto que fosse meu. Sou também um homem só, sem ninguém que me dê continuidade. E agora me matas afogado na maior dúvida da minha vida.

Eu que te queria tanto. Que já te amava com se tivesse encontrado a verdadeira felicidade. Preparara-me para casar contigo. Sem te dizer nada, com certo receio de me recusares, de não pretenderes a te unir a alguém em definitivo. Preparava-me e esperava a oportunidade de te falar. E tudo agora se desmoronou em cima de mim.

O segredo de uma pessoa a quem se ama, por ínfimo que seja, é como se fosse uma montanha rolando por cima da gente. Hoje foi o meu dia aziago, o enterro de todos os meus sonhos.

- Não é nada disso, mestre Amaro. O que eu não queria era justamente não me insinuar. Tenho aquele filho que desejava e quando mais tarde perguntasse pelo pai, não saberia o que dizer ou teria que confessar que era um filho de uma mulher solteira. De uma mulher que não havia tido a ventura de se casar, embora amando tanto quanto te amo.

Não poderia acreditar que pensavas em casar com uma criatura como eu que já se encontra sem a pureza das virgens.

- Pela cruz Divina que cheguei a pensar que esse teu filho era filho de outro.

- Ah! Então, não tinhas confiança em mim. Supunhas que eu seria capaz de uma traição. É isto que querias dizer?

Não percebias que eu não era daquelas mulheres que trocam noites de ilusão por dinheiro. Nunca me faltou pão e nem roupas. Faltava-me sim, amor, carinhos, amizades. Sobrava-me solidão.

- É que um grande amor do tamanho do meu, desconfia até das onze mil virgens. Desde o dia do nosso primeiro encontro, comecei a ter ciúmes de ti, coisa que jamais havia sentido por outra mulher. Mas vais acabar com as explicações. Vai ou não, casar comigo? Sejas sincera para depois não te maldizeres.

- É o que eu mais poderia desejar Amaro. São duas grandes felicidades batendo ao mesmo tempo na mesma porta. Sempre fui uma mulher que nasceu para amar puramente. E não tive culpas de teres aparecido em minha vida e nem te querer tanto. Mas de ti não tinha o direito de exigir, nem pedir mais nada. Além da felicidade de ter um bom amigo. Não merecia mais nada. Casar contigo é assim como uma rosa que desabrocha novamente, numa manhã luminosa e orvalhada. Poderia pensar em tudo, menos numa felicidade tão grande. Quem sofreu como eu é que pode medir o tamanho das asas douradas da felicidade. Tenho medo de morrer de amores.

- Chega Mirícia, vem cá. Vamos festejar nossa felicidade.

E lá se foram os dois para jantar no melhor restaurante da cidade.

- Quero que tenham ciúmes de nossa felicidade. Felicidade minha, tua e desse safadinho que vai nascer... Sei que vou matá-lo de beijos... Mato os dois... Tu e ele.

Durante o jantar no “Come-se Bem”, Amaro interpelou Mirícia. Não entendia como ela era tão confiante que se casaria com ele sem nada conhecer de seu passado. Não sabia bem quem era ele e muito menos de sua origem.

- Não sabes Mirícia, que te arriscas muito, apesar de nosso bem-querer. Se eu fosse, por exemplo, um criminoso perverso, um sujeito casado que abandonara a família, um procurado pela justiça. Conhece-me de pouco tempo e quem sabe se não sou um homem exigente demais, mandão digamos mesmo, intolerável?

- Olha mestre Amaro, uma mulher sofrida como eu, tem faro, vê as coisas que estão por trás do muro. Não creio que uma pessoa com os teus hábitos, com a tua conduta, com o teu recato, possa ter uma má procedência. Em todo o caso gostaria de saber mais sobre tua vida. Só por curiosidade. Só isto!

- Pois é minha “nega”, admiro teu julgamento. Na verdade nunca fui uma má criatura. Nasci pobre e ainda o sou, relativamente à riqueza de muitos. Creio que minha maior fortuna, hoje, é haver te conhecido e nos casarmos.

O comportamento é o meu caráter. Sempre fui assim desde menino. Tenho família no vale do Piancó, onde nasci. Quando desapreço daqui por alguns dias é porque vou visitá-la.

Hoje está muito melhor do que anteriormente. Já não se fala mais em pobreza. Não é rica, mas vive bem. Meu pai, e minha mãe estão bem velhinhos, mas saudáveis. Só se vendo como são felizes e como adoro vê-los. Cinco por cento do meu trabalho é para eles. Não é muito, mas é o que posso fazer-lhes. Aliás, não precisam disso. Não querem; no entanto, sabem que me magoam se não aceitarem.

- Não precisamos meu filho. Guarda para a tua velhice que o mundo dá muitas voltas.

- Para as voltas do mundo já tenho minha previsão. Dêem aos netos, aos afilhados. Também não é grande coisa. Não me faz falta.

Hás de ver como são duas criaturas adoráveis. Mamãe sempre me pergunta por que não me casei. Saí de lá quase menino. Um rapazinho inexperiente, mas um tanto teimoso. Saí para teimar com a vida.

- Mas o nome de tua família?

- Andrade.

- Andrade?

- Sim. Souto de Andrade.

- De onde? Deve ser brincadeira tua. Sou também Andrade Santos.

- Como?

- Isto mesmo. Filha de Idalina Souto de Andrade, naturalmente uma tua parente, que se foi para o sul de Pernambuco e nuca mais viu a família.

- Idalina Souto de Andrade, irmã de minha mãe, e de quem ela sempre fala que desapareceu com o marido numa grande seca.

Meu Deus, tu, minha prima legítima. Que coincidência, meu Deus. E minha tia Idalina onde anda?

- Vive lá mesmo com meu pai, dono de uma mercearia. Vivem bem. E foi de lá que fugi para a infelicidade.

- E porque não voltastes?

- Envergonhada do que fiz. Nem valia a pena recordar minhas amarguras.

- Ah! Não. Depois de casados iremos visitá-los. Imaginas o quanto tem sofrido sem notícias tuas.

- Imagino, sim. E não podes avaliar as minhas angustias por não vê-los há tanto tempo. Além disso, sou filha única. Cometi os mesmos erros de todas as moças apaixonadas. Paixão é uma espécie de doidice que ataca as pessoas e morre logo. Confundia paixão com amizade. Minha mãe e pai são tão bons, que nunca tive coragem de voltar a vê-los e nem de dizer como estou e quando sofria. Fizeram o máximo para evitar meu casamento, mas a tal paixão me cegara. Chegara a dizer-lhe que não queriam a minha felicidade.

Ah! Se tivesse o dom de adivinhar coisas do futuro. Morro de vergonha de voltar. Não quero que saibam que sofri.

- E onde mora o miserável que te traiu? Vou ajustar contas com ele, doa em quem doer.

- Não. Não. Basta vivermos a nossa felicidade. Já assisti o enterro da minha frustrada paixão. Frustrada e infeliz. E basta saber que o miserável anda se arrastando na pior miséria. Felizmente casei-me apenas no religioso. Tentou voltar para mim. Escreveu-me cinicamente. Não lhe dei resposta. Dele toda distância ainda é curta. Apesar disso, sempre vivi assustada, com medo de avistá-lo em qualquer curva do caminho.

- Bem, de hoje por diante podes ficar tranqüila. Nos casaremos com o juiz logo amanhã. Ou achas tarde... Já são onze horas da noite. Falta apenas uma hora para amanhã. Não adianta mais nos separarmos.

- Não, não se deve ver a noiva no dia do casamento. Vamos nos separar, só veremos agora no cartório. Somente depois das assinaturas, podes acender a tua lamparina e eu a minha. Deixa de tanto fogo.

- E como será mesmo o nome do menino?

- Caso seja homem, o nome do teu pai, se for mulher, o nome de minha mãe.

- Está apostado.

- Dito e feito.

- Vou te levar em casa antes das doze.

- Fica comigo.

- Nada disso. Amaro não quebra a palavra, meu primo.

- Depois eu desconto uma noite de atraso...

- E eu também.

- Vê bem. Depois não quebras a palavra...

- Mas, como é que vou cuidar sozinha, este resto de noite, deste menino peralta?

- Se ele espernear dá-lhe umas palmadinhas... E olha, às onze horas no cartório.

- E vou só?

- Não, nunca. Já tens companhia aí dentro. Queres melhor?

Na hora exata casaram-se.

- Espere, são parentes. O mesmo sobrenome.

- Descobrimos ontem que somos primos.

- E onde tiraram esse sobrenome Souto de Andrade?

- Somos da gema da família no vale do Piancó.

- Vale do Piancó?

- Exatamente.

- Quando fui juiz lá, conhecia um casal de velhinhos, também Souto de Andrade. Duas criaturas adoráveis. Estive em casa deles em Nova Olinda.

- Em casa de meus pais, minha Nossa Senhora Aparecida! E que foi fazer lá o senhor?

- Andava visitando parentes distantes. Não sou de lá, mas é lá que estão as raízes de minha família. Onde andar um Souto de Andrade, está um parente. Então somos da mesma grei. Que coincidência curiosa. Meus parabéns, onde vão morar?

- Aqui mesmo.

- Então, seu mestre Amaro, vão jantar hoje lá em casa.

- Mas a gente havia feito uma aposta. Tirar o atraso.

- Tiram depois do jantar. Vá devagar, mestre Amaro: Coelho velho não agüenta carreira...

- Está ouvindo, Mirícia?

- E vais quebrar tua palavra...

- É conselho do Dr. Juiz. É melhor quebrar a palavra do que outra coisa...

Mas foi conversa do mestre Amaro. Depois do jantar, tiraram o atraso de uma noite perdida. Amor de casado era diferente. Era a posse legal dentro do código civil, com papeis passados. Tinha agora a vida toda pela frente e sem ter mais que “rezar” às escondidas.

- Mestre Amaro, casou-se minha gente!

- Com tal de Mirícia!

- Ah! Sei. A desquitada. Um pedaço de mulher. Vai tirar o sarro do mestre Amaro. Uma lapa daquela, descansada e do vale do Piancó, segundo dizem. Não dou um mês que não esteja andando de muletas. Bem que se sabia que o espertalhão estava andando pro lado de lá. Viu que não conseguia nada e terminou se casando. Segundo as más línguas, o padre Beldroega já havia mandado o sacristão convidá-la para ser a zeladora da igreja.

- Mas, agora, Deus nos livre que mestre Amaro venha, a saber, da tramóia do reverendo. Falam que também é do vale do Piancó e cabra daquelas bandas não torra pipoca com mururú.

- Vale a pena fazer uma fofocazinha para ver o que dá...

- Nem se meta. O padre Beldroegas é sim das bandas de Catolé do Rocha, terra de cabra doido, cala teu bico.

Dois meses depois, mestre Amaro, andava mais gordo e mais corado. A dona Mirícia anda empinada.

- Brinquem com o mestre Amaro... Ontem estive na oficina dele. Está fazendo uma cama de casal reforçada.

- Era encomenda?

- Que nada. Disse que a outra havia se quebrado...

 

*O conto pertence ao livro Vidas Nordestinas, no prelo.

 

**Grijalva Maracajá Henriques – Historiador Positivista.

 

 

 

 

 



 

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