quinta-feira, 18 de abril de 2013

A chuva Grande


                                                   



A chuva Grande*
João Henriques da Silva**
(In Memoriam 20/09/1901 – 16/04/2003)


 Dia de sábado, perto de uma hora da tarde. Estava-se num período de seca como pouco se tinha visto, faltava-se água para os bichos e mandava-se apanhar para beber com mais de uma légua numa cacimba no topo de um imenso bloco de granito. Água finíssima. Era comprada. Pagava-se por lata ou ancoreta.
Meu pai havia escavado uma cacimba bem no bojo do açude novo. Difícil do gado descer para beber. Naquele dia, desceu uma vaca magra, prestes a ter cria. Não conseguiu sair. O vaqueiro conseguiu retirá-la e deixou-a pertinho de casa à sombra do “umbuzeiro cabeludo” como se chamava. Não teve jeito. Findou morrendo antes do meio dia.
O vaqueiro extraiu o bezerro e colocou-o no galpão da casa de farinha. Nesse momento, exatamente, começaram a cair grossas gotas de chuva. Repetidamente, o céu começou a despejar água, como se estivesse todo furado.
Chuva sem vento, sem trovão, uma tromba d’água. Foram duas horas e cinco minutos de destampatório. As xiringas d’águas caiam verticalmente. Não se via mais chão. Era por toda parte um lençol d’água. Com meia hora de chuva, já se ouviu o estouro do açude novo que não era lá tão pequeno.
 A avalanche cortou-o bem no meio da barragem. E quanto mais tempo passava, mais água caía. Meu pai não estava em casa. A chuva era localizada. Menos de meia légua em raio.
Se não fora a tranqüilidade com que caía, teria se arrasado tudo. Já no meio da chuva para o fim, chegou o Sr. Francisco Patrício que vinha prestar socorro.
 Sabia que estávamos em casa sós com minha mãe. Tinha feito uma volta imensa procurando por onde passar. Felizmente encontrou todos em paz. Minha mãe, coitada, ora rezava no quartinho dos santos, ora corria de um lado para outro para nos proteger.
 Uma santa. Com a chegada do senhor Francisco Patrício, todos se acalmaram mais. Era um homem corajoso e muito amigo da família. Era um amigo e compadre.
Depois da chuva, meu pai chegou. Lá na cidade e por perto não havia caído uma gota d’água. Ficou surpreso e espantado com o dilúvio.
 Começaram, então, os boatos.
- Foi castigo em cima do Coronel Virgolino. Como não chovia, ameaçava furar com uma vara as nuvens que por ventura paravam.
 É pouco, para não zombar com as coisas de Nosso Senhor. Está pensando que castigo é só pra gente pobre, hein!
 Nós, todos os filhos, tínhamos pena e aflição de minha mãe. Rezava, rezava e quanto mais rezava mais chovia.

*O conto pertence ao livro “Vidas Nordestinas”, no prelo.

**Meu pai nasceu na Fazenda Arara, Município da cidade de Esperança Paraíba, onde ocorreu esta tromba d’água.

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