quinta-feira, 29 de novembro de 2012

TÍTA


TÍTA*
João Henriques da Silva
(In Memoriam – 20/09/1901 – 16/4/2003)

A mãe não era casada e largou-se no mundo com um sujeito qualquer. Títa ficou só com oito ou nove anos, pelas casas dos outros. Da mãe nunca mais teve notícia. E também não lhe interessava muito. Ficou moça, empregando-se aqui e ali, como cão sem dono.
E é num desses lances da vida que a pessoa toma uma resolução. Desenvolveu um corpo que assustava as patroas. Além disso, tinha um requebro ameaçador. E por isso não parava nas casas.
- Moleca enxerida. Não respeita a casa e anda botando os olhos atrevidos para o meu marido. Como não confio muito nele, vou mandá-la embora. Quero lá uma tentação daquela lá em casa.
E era assim.
No entanto a moleca Títa, não tinha essas intenções. Apenas havia ficado daquele jeitão e não fazia mal se mostrar. Por vezes arrependia-se amargamente de ser aquele pedação de mulher assustador. Não para nas casas porque achavam que ela era uma ameaça.
E era aquela luta para conseguir novo emprego. Nunca lhe diziam verdadeiramente porque estava sendo despedida. Arranjavam sempre outra justificativa.  - Não, não preciso mais de empregada.
Ela sabia muito bem que não era por isto, mas não havia escapatória. Que culpa tinha de ser tão opulenta. - De ter aquele rosto atraente, aquelas pernas bem feitas, os seios aprumados e pequenos, aquela cintura que dava destaque as outras partes do corpo. - Nenhuma.
Também não tinha culpa o patrão ter casado com uma mulher feia e desengonçada. Era problema de cada um ou, apenas má sorte da coitada da mulher. E tivera sorte ter se casado. Algumas pareciam mais um trem descarrilado. Muitas vezes notava que donas de casa, quando pedia emprego, passava o rabo de olho no marido, procurando ver sua reação diante dela. E era logo aquela resposta terrível:
 – Preciso não, meu bem! Quero lá uma sujeitinha daquela em minha casa. Aquilo é um desassossego. Deus me livre. E com esse manhoso que tenho em casa, metido a sonso.
E lá se ia Títa bater noutras portas. Não raro tinha que pedir comida e um lugar para dormir, lá pelas pontas de rua em casa de gente pobre. Quando se desesperava, chorava e era ai que chegava a ter ódio da mãe que a deixara para se ir com cabra safado.
Dona Clemência, que também tinha passado por isso, muitas vezes sofrido por falta de emprego e rejeição, deu-lhe uma dica: - Vai, Títa, vai à casa do padre Severo. Pelo menos é solteiro, não tem mulher ciumenta. Quem sabe se não te arranjas bem por lá. Todos dizem que o padre Severo é quase santo.
- Pode até ser. Então vamos lá comigo, dona Clemência. O padre não me conhece e conhece a senhora. Já não tenho mais jeito de andar implorando trabalho. Faço tudo para agradar com minhas obrigações, mas sempre me mandam embora.
- Olha Títa, tenho experiência. Toda mulher tem medo de outra mulher bonita. E logo com esse teu corpo abençoado. E quando a patroa é feia, então, não há remédio. Fica andando pra dentro e pra fora, fiscalizando o marido. Volta e meia ou chama por um ou por outro. Quer sempre saber onde andam.
- Mas eu não sou dessas, dona Clemência. Nunca dou linha para ninguém. Tenho é que me casar como as outras, ter minha casinha e não fazer igual a minha mãe que me abandonou por um sujo ordinário. Será tempo perdido, tentarem. Ou me caso ou vou morrer como nasci.
- É. Elas não sabem de tuas intenções. O pensamento é sempre outro. E a maioria, Títa dessas empregadinhas, não tem esse teu pensamento. A maioria é gente safada. Depravada. Umas catraias. E é por isto que as donas de casa se assustam.
- Infelizmente não posso fazê-las acreditarem em mim. Não tenho mãe, mas tenho vergonha.
Baterem a porta do padre Severo. Contaram-lhe toda a história. Precisava de um emprego para Títa.
O vigário olhou para Títa, com espanto. Poucas vezes tinha visto uma tentação daquela. E teve medo. Dar emprego a uma coisa daquela, era o mesmo que abrir a boca do mundo. Perderia seu ar de santidade e logo o senhor bispo iria saber de sua reviravolta.
- Minha filha, já tenho arrumadeira e cozinheira. Não tenho condição de ficar contigo. Sou um solteirão, um penitente. Se ao menos tivesse filhos para criar, poderia ficar como babá.
- Mas senhor padre, eu lavo roupa, engomo, faço qualquer coisa que houver, e que o senhor quiser.
Nestas palavras, o padre Severo arregalou os olhos. Ninguém até então havia lhe despertado os instintos. Mas ali estava o demônio cutucando-o com vara curta. Desembaralhou as idéias, colocou-as em ordem, fez uma analise rápida, subiu nas paredes e tomou uma decisão perigosa. Ainda pensou que aquilo deveria ser arte do capiroto, mas a tentação aguçava cada vez mais os seus desejos, até então reprimidos. E perguntava a si mesmo, como lhe estava acontecendo àquela reviravolta. Benzeu-se, como que ia rezar, e apelou para o seu anjo da guarda, mas o bichote estava cochilando ou mal intencionado. O que lhe fervia lá por dentro endoidecia-o.
Fechou os olhos para ver melhor e não teve jeito. Não via mais ninguém senão, Títa. Títa desafiando-o. Títa prometendo fazer o que ele quisesse. Como é que antes não tivera aqueles pensamentos. Certamente nunca havia visto uma Títa, com aqueles olhos implorando, aquele arfar dos seios, uma cintura e umas pernas tão insultuosas. Não tinha mais jeito de fugir. O demônio havia acordado dentro dele. Sentia até uma certa repugnância do cheiro de incenso e de vela queimando. Atordoado, rezou o credo só para si, enquanto misturava tudo com a visão de Títa. Já não se sentia mais dono de si. Títa entrara-lhe nas veias e nos instintos como se fossem gotas de sumo satânico. Nos 42 anos de vida e seus 17 de sacerdócio, jamais sentira aquele demônio que lhe tirara a confiança em si próprio e em seu divino apostolado.
Até então os seus olhos nunca haviam enxergado as atrações de um corpo de mulher com aquela força que o esmagava. E a culpa de tudo isso era a velha Clemência que teve a lembrança de levar-lhe Títa para pedir-lhe emprego. Mas que diabo, já viu centenas de mulheres novas e bonitas, conhecia suas intimidades, através da confissão, mas tudo isso nunca bulira com os seus instintos de criatura humana. Escravo das proibições canônicas e esquecera-se inteiramente das coisas terrenas, dos prazeres da vida.
Distanciara-se de tudo e nem chegara a sonhar em coisas que não fossem místicas; desde pequeno enfiado em colégio de padre e os longos anos de seminário o isolaram da vida material. Era como se estivesse por trás de uma vidraça, virado para a contemplação, o que estava do outro lado não lhe aquecia o coração nem despertava desejos. E, agora, a vidraça partira-se e passara a ouvir o ruído do mundo lá fora, lá de onde vinha Títa com aqueles olhos, aqueles seios querendo furar a blusa e aquele corpo adoidado. Como era que nunca havia olhado para as coisas com os seus olhos mortais. Envolto num manto de santidade e quando se julgava já pertinho do céu, Títa vem e desmorona todo o seu passado místico.
Deu a dona Clemência, uma desculpa: - Seu espírito e sua formação religiosa, não lhe permitiam deixar desamparada. Mesmo sem trabalho específico teria um lugar para ela. Podia ficar.
- Sim senhor. Ela vai buscar as coisinhas dela e logo estará aqui. Não faz questão de dinheiro. Quer comida e onde dormir tranquila  Só isso. No mais o senhor acerta com a menina. Ela é uma criatura simples e atenciosa. Faz de um tudo. Pode usar e abusar. Está habituada a todo serviço. Deus lhe pague padre Severo. Não irá se arrepender. Apenas peço-lhe que tenha paciência com ela. É uma menina boa e fiel.
- E a família dela, onde vive?
- Não se sabe. O pai foi qualquer um e a mãe abandonou-a e fugiu com um malandreco. Criou-se só e pela casas dos outros. Vai completar dezenove anos. Como disse ao senhor, as famílias não querem moças bonitas em casa. Toma-se de ciúmes e ela é quem sofre coitadinha. Mas aqui com o senhor ficará a vida toda. Deus permita que o senhor goste dela. A menina é pau para toda obra. Não tenha receio. É de copa, cozinha, arranjo de casa, etc. etc.
Padre Severo ficara preso aos etc. etc. Quanto ao resto, poderia não fazer nada. Títa chegou. Quatro paninhos e uma caixinha de pó de arroz barato. Vinha entonada na roupinha melhor, que lhe modelava mais ainda o corpo esbelto e adoidado. Padre Severo benzeu-se. Chamou à arrumadeira e recomendou que cuidasse da menina: casa, comida e banho. - O etc. era com ele. – Que a orientar-se sobre os hábitos da casa. E no dia seguinte fosse comprar o que ela necessitasse. Roupas, sapatos e o que as mulheres gostam de usar. Fosse com a Títa para ela escolher. Queria-a limpa e apresentável. Deveria esta sempre pronta para se apresentar em qualquer circunstância. Era como uma pessoa de casa. Deve andar igual a vocês.
- Mariana, já reparastes essa tal de Títa. Quem diabo já viu uma criatura com um corpo daquele. Não tem um defeito. Padre Severo faz cada espécie de caridade. Só porque estava seu emprego trouxe-a pra cá. Duvido que aquilo seja uma moça.
- Sem pai, sem mãe, solta no meio do mundo, já deve ter se perdido.  E com um corpo daquele, minha filha, é difícil escapar das unhas dos gaviões.
- Sei não, Danila. A gente às vezes vê cara e não vê coração.
- Mas não achas que é um precipício, padre Severo com um petisco dentro de
casa. Vamos por o olho nos dois.
            - Que coisa Danila. Padre Severo é um santo. Aquilo nem sabe se existe mulher. Pode até dormir no quarto dela e na mesma cama. Só pensa em rezar. Fora disso, o mundo para ele não existe.
- Até certo ponto, Mariana. Vai assim até que o diabo atiça.
- Vais ver. Nunca se enxeriu pra nosso lado.
- Ora, nós somos uns bagulhos diante da Títa. Uma coisa daquela incendeia qualquer um. Ora, vi a menina tomando banho. Corpo moreno, e perfeito de cima a baixo. Tive vontade de pegar-me com ela. Por isso mesmo vou sair hoje à noite. Tenho que me aliviar. Se ao menos padre Severo fosse homem, ficava tudo aqui mesmo... Mas com a Títa, sei lá...
- Quer dizer, que se o padre quisesse, dormirias com ele?
- E porque não? Era melhor do que andar lá fora com um e com outro.
Títa veio servi-lhe o jantar. Mandaram-na de propósito e ficaram na observação. E não haviam se enganado. Padre Severo ficara só pedindo mais coisas e não despregava os olhos de cima de Títa. Depois começou a fazer-lhe perguntas inocentes, embora com outras intenções.
Títa respondia como se estivesse com um desconhecido. Não é que não simpatizasse com o padre Severo, mas por nem pensar naquilo que ele estava pensando.
Era como se fosse um copo d’água saído da geladeira. Por que aquele indiferentismo. Seria que todas as mulheres fossem assim. Considerou-se um toupeira. Não sabia de nada, e agora estava encalhado, sem saber como se pisa em cima das brasas.
            - Traga-me um pouco de vinho, Títa, para ver se abro o apetite. – Preciso descobrir o fio da meada, ver por onde deveria começar.  - Engoliu um copo de vinho e encheu-o de novo. Criou um pouco de ânimo, mas o que lhe faltava eram as palavras, e a forma de dizer as coisas. Nunca havia lido qualquer coisa sobre o assunto e nem observado como agiam os namorados. Afinal teve uma saída. – “Até agora não pensastes em te casar, Títa. Ninguém se interessou ainda por ti? O casamento é muitas vezes uma ótima solução para certos problemas. Um bom marido faz parte do destino das moças.
- Ainda não, padre Severo. Nunca tive tempo de pensar nessas coisas. Sempre fui uma sofredora. E, além disso, casamento sempre me fez medo. Nas casas onde me empreguei sempre ouvia as patroas se maldizendo. Ciúmes do marido, preocupação com os filhos, desentendimentos e tantas outras coisas. Assim, preferia esquecer.
- Mas nunca sentistes algum desejo. Nunca te afeiçoastes por alguém?
- Já e muitas vezes, mas procurava não manifestar e a coisa se apagava como tivesse acabado o azeite de lamparina. Muitos sujeitos já tentaram, mas fora de um casamento, Títa não se deixa enganar. Conheço muitas moças que foram iludidas, e hoje fazem parte das arrependidas. Estão por aí abandonadas e sofrendo. Muitas caíram na vida das pensões. Mas Títa é diferente. Sofreu demais até hoje. E quero que o senhor reze por mim e me proteja.
Padre Severo teve vontade de mandá-la embora e de excomungar a velha Clemência. - Como era que o atirara num precipício daquele e agora aquela doidinha se saía com um bê-á-bá daquele. Não queria nada. Certamente fora a velha Clemência que metera aquelas idéias na cabeça desmiolada de Títa. Gente com tais princípios deveria ter nascido aleijada e feia. Atiram em cima dele uma coisa daquela, fazem desmoronar uma existência de moral religiosa, e a debiloide se sai com aquela teoria absurda. Casamento! Por ventura será que o palavreado do sacerdote ou a água benta tem tanto poder assim? É a mesma coisa que dizer, a troco de umas patacas, toma essa moça, leva para cama e faz dela o que quiseres. Tudo formalidade. Mas isso não me vai ficar assim. Vou meter a cara nos livros e aprender o que não me ensinaram. Resultado: vou perder o sono, errar nas missas, nos batizados, em tudo, só por causa da velha Clemência... Quem tem uma Títa, não anda mostrando a ninguém, principalmente a um pobre diabo que sempre viveu em jejum. Vou terminar maluco ou rasgando em tiras, essa camisola preta. Suicídio não resolve, e olhos famintos através da roupa de Títa para ver-lhe as formas do corpo, muito menos.
 E vinha-lhe a memória o fato absurdo de nunca ter visto uma mulher sem roupa já naquela idade, o que, agora, lhe parecia um absurdo. - E talvez fosse melhor nem ver. Poderia ter um enfarte. E é possível que isto acontecesse com ele.
Títa afastou-se pensando nas perguntas do padre. - Porque estaria interessado em saber a sua vida. Talvez a quisesse ajudar arranjando-lhe um bom casamento. - Mal sabia que as intenções eram completamente outras.
- Títa, que tanto perguntavas ao padre Severo? Deixa o homem em paz, menina. Ele é um santo. Tem a inocência de um anjo. Nunca ao menos sorriu para o lado da gente. Até parece que tem medo de se aproximar. Só se entra no quarto dele, depois que sai.
- Para mim é indiferente. Mas eu acho uma pessoa bondosa. Interessou-se por mim, deu este emprego e não o vejo com atravessamentos.
- Mas não tirava os olhos de cima de ti. Parecia que queria devorar-te. Abre teus olhos, menina. Não tente fazer de um santo, um pecador.
- Eu, hem! Vocês que se cuidem. O que é meu é só meu. Sou uma moça e exijo respeito seja de quem for. E não vejo nada demais em conversar com o padre Severo. Pra mim, tanto faz ser padre ou não. Ninguém vai me levar sem antes casar comigo. Apenas costumo tratar bem todo mundo. Se eu quisesse conquistar alguém, já o havia feito. Nunca faltou quem me perseguisse. Mas ninguém até agora botou a mão em cima de Títa. Agora no dia que sentir vontade de me casar, então irei procurar escolher e decidir-me. Não tenho manhas encobertas. Tudo meu é claro como a luz do sol. Sou uma criatura sem pai, sem mãe e por isso mesmo tenho que defender-me sozinha. Se eu cair, ninguém via me levantar.
Quase dois meses já se havia ido e padre Severo sentia-se cada vez mais desiludido e frustrado. Já pedia a todos os santos que Títa se desgostasse e saísse. Pelo menos não a vendo, diminuiria sua tensão.
Mas ao contrario disso ela mostrava-se mais atenta, e mais atraente. Quanto mais exigia dela na expectativa de magoá-la, mais a Títa se esmerava em servi-lo e, já agora com um rizinho de satisfação.
- Valei-me meu santo Dino. - Já não sabia mais para que santo apelasse. Parecia até que a santada toda conspirava contra ele. Saía para a cidade, para não vê-la. Mas Títa estava dentro dele e o acompanhava como uma obsessão. Pouco lhe faltava para endoidar. E para que serviria um padre louco. E todo aquele dinheiro que juntara quase como um usurário. A família não precisava dele e não tinha como usá-lo. Sem mulher, sem filhos e agora aquele estado lamentável, a ponto de atirar pedra na lua.
- Títa! Tenho toda confiança em ti. Sei que serás capaz de guardar um grande segredo e usaras da maior franqueza, caso o que te vou dizer não seja do teu agrado. Prometes ficar só e só entre nós?
- Ora padre Severo. Creio que o senhor já me conhece bastante.
- Mas o assunto é serio demais.
- Como for padre Severo, juro!
- Pois bem, Títa. Talvez já tenhas percebido que gosto muito de ti. Se nunca te disse nada é porque nunca tive coragem. Mas agora já chegou ao extremo. Tua vinda para esta casa transformou minha vida. E tenho sofrido muito por isso.
- Então, padre Severo, vou embora neste instante. E o senhor perdoe-me. Julgava que estava contente comigo. Podia ter me chamado a atenção e me corrigiria ou havia voltado sem perda de tempo.
- Não é nada disso, menina. Apaixonei-me por ti e nunca tive coragem de confessar esta minha fraqueza. Se prometeres casar comigo, deixo a batina, vamos embora daqui para bem distante e lá nos casaremos. Terás a vida que mereces e eu serei a criatura mais feliz deste mundo velho de Nosso Senhor.
- Mas eu não sou ninguém, padre. Depois irá se envergonhar de mim. Não estudei. Mal assino o nome e soletro algumas palavras.
- Por saber ler é que me perdi e tenho medo de perder-te. Sei que és uma moça honesta e isto me basta.
- Isto, padre Severo, é felicidade demais para uma criatura como eu. Mas não desejo fazê-lo infeliz. Com pouco tempo se cansará de mim e sofrerá ainda mais.
- Olha Títa. Para abandonar o meu sacerdócio de tantos anos, seria necessário ter muito amor. Já dei a Deus minha contribuição. Agora quero servi-lo de outra forma. Oferecendo-lhe um lar feliz. O casamento civil será nossa segurança. Temos o bastante para viver com tranquilidade. E onde estiver, dedicar-me-ei ao ensino. Não quero ser um ocioso e um inútil. Fizeste-me renascer. Estive até agora vivo para Deus e morto para o mundo e para o amor. Espero que me correspondas. Responda-me alguma coisa. Não tenhas receio de nada.
- Bem, padre Severo. O senhor sempre me pareceu uma criatura feliz. Também sou feliz depois que me acolheu. Na verdade tenho medo, medo de causar-lhe futuros constrangimentos. No começo tudo são rosas, mas depois somente Deus saberá. De mim, irei para onde me chamar. Apenas quero dizer que nada poderá acontecer antes do casamento.
- Ah! Títa, disso não tenhas duvida. Então vamos iniciar os preparativos. Mas será segredo entre nós dois. Nem a dona Clemência deve saber. Seria um escândalo. Ninguém deve saber pra onde vamos. Podes me fazer um favor?
- Decerto.
- Então, dar-me o primeiro beijo de minha vida. Na boca, sim.
 Para Títa, também foi o primeiro.

* O conto faz parte do livro “Vidas Nordestinas”, no prelo.




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